“Vamos tirar a Maria do meio daqueles tarados. Ela ta bêbada pra cacete”, grita Paulo, mais preocupado com a carona do que com o bem-estar da menina. Puxa o amigo pela junção do braço e antebraço, para tirá-lo daquela contemplação considerada inútil. “Amanhã você compra um postal. Museu não combina com carnaval, pô!”. João finge que concorda, e começa a andar rápido entre as pessoas dançantes. Enrolado em todas as serpentinas do carnaval, enfim ultrapassa a bateria. Encontra a menina de cabelos vermelhos quase agarrada com um pit-boy sem camisa e com boné da Raça Fla para trás. Paulo a interpela: “Tá anoitecendo, Maria, e essa chuva já ta enchendo. Vamos continuar na Lapa”. O flamenguista não gosta da interrupção, e o encara como se fosse aplicar um mata-leão. Percebendo o perigo, João se mete entre os dois, empurra o cara com o cotovelo – mas sem força – e diz que a amiga está passando mal, que realmente precisa ir embora. Não se sabe bem porquê, mas o pit-boy balança a cabeça afirmativamente, diz que o melhor é que cuidem da menina e se perde na multidão, cantando a marchinha “Bafo-de-Onça”. Paulo e João sorriem aliviados. Maria bufa, mas concorda em ir para o Rio.
Entre a ponte
O Palio está na Ponte Rio-Niterói, pela pista da direita. Segue no máximo a 60 quilômetros por hora. João está no comando, enquanto Paulo dorme ao seu lado, com a cabeça encostada na porta. No banco traseiro, Maria fala sem parar, lembrando dos “gatinhos maravilhosos” que havia nas ruas niteroienses. O motorista não quer saber de nada. Liga o som do carro. Um locutor com voz empolgada (e quase brega) afirma aos berros que o carnaval carioca é o maior espetáculo da Terra. O som é novamente desligado.
Já na alça de acesso ao centro do Rio, Paulo acorda e diz que está a fim de continuar em algum bar da Lapa. Maria concorda: “Não volto para a casa de forma alguma”. João não diz nada. Leva a dupla para uma rua atrás dos arcos e se despede. Segue, sozinho, para a casa. Deixa o carro no estacionamento e sobe pela escada os seis andares do prédio decadente. Abre completamente a janela e, enquanto a brisa geladíssima invade a casa, tenta encontrar a ponte. Busca Niterói. Procura o monumento do Oscar, agora deste lado da Baía. Mas a neblina não deixa.
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