quinta-feira, 24 de julho de 2014

Última saída

O jogo estava perto do encerramento no Pacaembu. Mais uma partida normal, mais uma vitória sobre o Flamengo, se a peleja válida pela segunda rodada do Campeonato Brasileiro não representasse a despedida oficial dos corinthianos de sua casa por décadas, para, depois, fazerem nova morada no moderno estádio da zona leste.

Ao trilhar do apito do árbitro, a torcida ficou desnorteada. Eu estava ali e vi. Sem nada combinado, sem a intervenção do histérico departamento de marketing do Corinthians, os 39 mil alvinegros presentes ao estádio do povo paulistano não derem um passo sequer em direção à saída. Eram 39 mil saudosistas e desorientados corinthianos.

A maioria ficou estática, admirando o gramado, a curva arquitetônica acima do portão principal, os refletores, qualquer detalhe que passou despercebido e que no dia representava uma dolorida última olhada. Outros andavam de um lado para o outro, como para pisar de forma derradeira no piso frio do cimento do Tobogã.

Não havia cantorias nem provas efusivas de amor. Era a sensação de quem compra uma bela casa nova, após muita labuta, mas se despedaça o coração de largar a saudosa maloca alugada. Foram uns 10 minutos de puro e absoluto silêncio. Interrompido, apenas, por um sujeito mais sentimental ao meu lado, de uns 40 e poucos anos, que chorava de soluçar.

Eu comecei a subir os degraus em direção à saída. Quando entrei na passarela que leva ao portão, ouvi o primeiro cidadão ao meu lado a murmurar: “Timão eô, Timão eô, Timão eooô”. Não que a mesma cena já não tivesse se repetido mil vezes. Mas nunca com tanto respeito e reverência, como se fosse em uma procissão. É isso que aconteceu na saída dos torcedores do Tobogã: a mais sincera procissão em reverência a um dos mais importantes símbolos religiosos de boa parte dos paulistanos.

O “Timão eô” se tornou um exclusivo uníssono. Ninguém ousou gritar sequer um “Vai Corinthians!”. Foi um mantra como deve ser, com respeito e profundidade. O coro acompanhou os pretos e os brancos até o caminho da rua. Dali, cada um seguiu a sua rota. Com a melancolia de saber que nunca mais fariam o caminho inverso. O Pacaembu se tornou apenas uma foto no coração. Mas como dói.