O Corinthians não ter
Libertadores era um patrimônio cultural imaterial de São Paulo. Era
algo tombado pelo Iphan dos bares, bairros e firmas, sagrado, mantido
pelas torcidas rivais e pelos próprios corinthianos. Havia um
sentimento de perenidade no ar, quase um Cristo Redentor paulistano.
De repente, não mais que de repente, aconteceu algo da mesma
proporção de acabarem com o sotaque da Mooca, picharem o teatro
Municipal, construírem um arranha-céu no Ibirapuera ou mandarem
abaixo o Pateo do Colegio. A plaquinha corinthiana foi fixada no
troféu mais cobiçado da América do Sul.
Ser corinthiano desde
então se tornou algo diferente. Hoje saía em algum bar e diga que
você é corinthiano. No máximo ouvirá um “legal” sem muito
ânimo, de um torcedor adversário. Não há mais a batida mas
inescapável pergunta: “Quantas Libertadores vocês têm?”.
Responderemos “uma, e invicto”, e acabará o assunto. Já o
corinthiano, ao te reconhecer como um par, abrirá um sorriso e
apertará sua mão. Mas sem muito a falar. Não sinto mais aquela
lealdade dos fracassados, o rincão emocional mais confortável que
há. Todos estamos perdidos.
Sequer o título do
Mundial de Clubes de 2000 é chamado mais de Torneio de Verão.
Qualquer provocação esvaiu-se. As piadas aposentaram-se. A cidade
está mais insossa. Mataram o orgulho de ser perdedor. O maior
patrimônio cultural do futebol de São Paulo morreu com as duas
bolas de Emerson estufando as redes do goleiro do Boca Juniors.
Os diretores da
Conmebol precisam se reunir urgentemente para criar um outro
campeonato, sei lá, a Superlibertadores, e que o Palmeiras, São
Paulo e Santos se tornem campeões na primeira década. O Corinthians só deve conquistar essa faixa daqui a 100 anos. Não podemos permitir que a cultura futebolística da cidade morra de uma hora pra outra. Nossos filhos, netos e bisnetos agradecerão.