Eu preciso pedir desculpas. Eu errei, eu errei feio.
Vamos direto aos fatos: o frio não é melhor que o calor. Eu passei a vida
reclamando da temperatura alta de São Paulo no verão. Agora, que moro a milhas de onde praguejei um
bocado contra os 30 e poucos graus estampados nos relógios da cidade, sei que a alegria é oposta. Não há preço poder suar pelas ruas paulistanas e tentar
convencer o chefe a trabalhar de bermuda. O calor é insuperável. Por favor, me
desculpem, mesmo.
Estou em San Francisco/Berkeley há um mês e pouco. Eu gosto.
Eu moraria aqui para sempre se estivesse no Brasil e não fizesse frio. A
temperatura estar baixa não é o maior problema - o mau é isso ser todo dia. É
um acordar e dormir sabendo que as coisas não vão mudar. O frio diário só não é pior que ouvir de brasileiros como por estas terras tudo funciona - do
tamanho da moeda de 10 centavos ao preço do Iphone. Os americanos são muito
melhores. Só esqueceram de combinar com a natureza.
A Bay Area sequer é um dos lugares mais gelados dos
Estados Unidos, nem neve há. Talvez porque os latinos esquentaram a região. Há
torcedores de futebol americano a sério, gente fazendo rap no metrô, hipster
não muito insuportáveis criando suas coisas em espaços pequenos, apresentações
de músicas boas e cerveja forte. Entre barracas de cachorros-quentes e bares só
com cadeiras no balcão, muita coisa acontece. Andar sem parar pelas ruas da
cidade é uma coisa boa a se fazer - quanto mais se anda menos se perde, um
mistério difícil de explicar.
Num certo dia subi-e-desci as ladeiras de San
Francisco com uma menina ruiva de voz bonita e nome complicado com paciência
para entender a minha pronúncia sofrível. Ela me levou a um mirante escondido e
pouco visitado da cidade, vimos na tevê o maior clássico da região de futebol
americano (a partir de então sou Raiders desde criancinha) e expliquei a ela
sobre o Corinthians, o Fagner e os Racionais. Ela gostou, mas precisou ir. Só o
frio insiste em ficar.
Já aprendi uma par de palavras e expressões novas
neste um mês e pouquinho: each, pick up, pound, pilsner beer, turn
right, hangover, microwave, I used to, might, I had been (sim, vim com inglês bem básico). Quase que consigo entender a
maioria das palavras dos programas de televisão - mesmo que eu ainda não saiba
o significado. Bato papos simples e faço mímicas complexas com os companheiros
de escola. Pedir cerveja, comida e informações de ônibus já está moleza. Consigo
também explicar como o beisebol talvez seja o esporte mais idiota do planeta.
Por sorte, todos com os quais falei de fato preferiam o futebol americano
ou o basquete, dois esportes com E maiúsculo. Mas beisebol, meus amigos, é pior
que ser escalador de montanhas, como diria um grande jornalista de décadas
passadas.
É um prazer aprender cada palavra nova - é para isso
que aqui estou. Mas nada tão confort
place quanto o meu idioma. A língua portuguesa é a minha pátria. A minha
pátria é também o meu sol. Guardem um pouco dele para mim que já já eu volto.